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segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Privacidade da Leitura

Privacidade da leitura

Ruy J.G.B. de Queiroz // Professor Associado, Centro de Informática da UFPE

Uma dessas prerrogativas que se assume como inalienável é a privacidade do que se lê ou folheia numa biblioteca. Também, quando compramos um livro e o pagamento é feito em espécie, não deixamos qualquer registro na livraria. Mais ainda, em alguns estados americanos existe lei que proíbe a divulgação pública sem prévia autorização dos registros de empréstimos de seus leitores membros. Entretanto, a tecnologia da informação apresenta novos desafios para que tais expectativas se mantenham.

Ao que tudo indica, após mais uma investida corajosa e bem sucedida de Jeff Bezos (fundador e CEO da Amazon.com) com o lançamento (no final de 2007) do Kindle, uma espécie de equivalente do iPod para mídia impressa, a tecnologia do livro eletrônico finalmente se consolida. Uma matéria de B. Stone e M. Rich publicada em 23/12/08 no New York Times com um título interrogativo ("Poderiam os amantes do livro finalmente estar dispostos a trocar o papel por pixels?") traz o depoimento de vários editores, além de uma tentativa de estimar o tamanho desse mercado. Fica a impressão de que a era dos chamados "livros eletrônicos" (em inglês, "electronic books", ou "e-books") finalmente chegou. Em assim sendo, o portal Amazon.com, por exemplo, funciona tanto como livraria quanto como biblioteca, pois o Kindle permite ao usuário folhear uma amostra do livro que lhe desperta interesse, antes mesmo que decida adquirí-lo.

Em seu blog no Center for Internet and Society (Stanford), Ryan Calo demonstra preocupação com as repercussões que essa tecnologia deverá ter sobre a privacidade do leitor, e lembra que as limitações legais e físicas da biblioteca tradicional ajudam a garantir o pressuposto de que a leitura, assim como outros hábitos do pensamento, devem estar fora dos limites do escrutínio público ou privado. Há registro inclusive de tentativas do governo americano de compelir livrarias (tradicionais ou digitais) a entregar os registros de compra de livro,além do fato de que tais registros podem estar sujeitos à revelação no contexto de uma intimação proveniente de um processo civil. Por outro lado, ao atribuir a Robert Bork (jurista americano, mais conhecido como o autor de "The Antitrust Paradox") o crédito pelo estabelecimento de leis estaduais e nacionais que limitam a revelação de quais vídeos o cidadão compra ou aluga, Calo lembra que ainda são poucos os estados americanos que dispõem de leis que protejam especificamente a privacidade dos hábitos de leitura. E deixa um apelo para que os editores de e-books levem a sério a proteção à privacidade. A verdade é que não apenas a leitura, mas até a conversação informal pode estar desprotegida. Num material especial de 21/11/08 para o Wall Street Journal, Bruce Schneier (especialista em segurança da informação) diz que, após tomar posse, Barack Obama terá que abandonar seu Blackberry, pois caso contrário ficará sujeito a deixar que sejam revelados segredos de estado. A era da informação decretou a morte da conversação efêmera, pois tudo é gravado em e-mails, redes sociais, SMS, etc. E, citando Richelieu ("dê-me seis linhas escritas pelo mais honesto dos homens, que nelas acho motivo para enforcá-lo"), conclui acertadamente, que privacidade não diz respeito apenas a algo que se quer esconder, mas concerne valor econômico, liberdade, e direitos básicos do cidadão.

Um comentário:

Fatima Cristina disse...

Oi Ruy,
Acho que vale a pena conferir o que foi feito na Campus Party...
http://www.anacarmen.com/blog/2009/01/26/rescaldo-da-campus-party-a-quermesse-do-mundo-digital/
Abs, Fatima